sábado, 2 de novembro de 2013

Tristeza

Minh’alma é como o deserto
 De dúbia areia coberto,
 Batido pelo tufão;
 É como a rocha isolada,
 Pelas espumas banhada,
 Dos mares na solidão.
 
 Nem uma luz de esperança,
 Nem um sopro de bonança
 Na fronte sinto passar!
 Os invernos me despiram
 E as ilusões que fugiram
 Nunca mais hão de voltar!
 
 Roem-me atrozes idéias,
 A febre me queima as veias;
 A vertigem me tortura!...
 Oh! por Deus! quero dormir,
 Deixem-me os braços abrir
 Ao sono da sepultura!
 
 Despem-se as matas frondosas,
 Caem as flores mimosas
 Da morte na palidez,
 Tudo, tudo vai passando...
 Mas eu pergunto chorando:
 Quando virá minha vez?
 
 Vem, oh virgem descorada,
 Com a fronte pálida ornada
 De cipreste funerário,
 Vem! oh! quero nos meus braços
 Cerrar-te em meigos abraços
 Sobre o leito mortuário!
 
 Vem, oh morte! a turba imunda
 Em sua miséria profunda
 Te odeia, te calunia...
 - Pobre noiva tão formosa
 Que nos espera amorosa
 No termo da romaria.
 
 Quero morrer, que este mundo
 Com seu sarcasmo profundo
 Manchou-me de lodo e fel,
 Porque meu seio gastou-se,
 Meu talento evaporou-se
 Dos martírios ao tropel!
 
 Quero morrer: não é crime
 O fardo que me comprime
 Dos ombros lançar ao chão,
 Do pó desprender-me rindo
 E as asas brancas abrindo
 Lançar-me pela amplidão!
 
 Oh! quantas louras crianças
 Coroadas de esperanças
 Descem da campa à friez!...
 Os vivos vão repousando;
 Mas eu pergunto chorando:
 - Quando virá minha vez?
 
 Minh’alma é triste, pendida,
 Como a palmeira batida
 Pela fúria do tufão.
 É como a praia que alveja,
 Como a planta que viceja
 Nos muros de uma prisão!

  (Fagundes Varela)

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