sábado, 2 de novembro de 2013

João Ayres


"Não irei encontrar jamais solidão dos que se foram
Estas horas nas quais minha mente parece ruir
A escuridão dos oceanos longínquos me sufoca
O tédio é maior quando me calo para sempre
A angústia insuportável que abre todas as portas
Algo em mim me estrangula como um dia nublado
Minha alma agora rasteja sem lugar
Ouço o que não dizem os loucos que me olham de esguelha
Pertenço às noites mais frias de um inverno impiedoso
Passo pela vida que me ignora
Como um navio fantasma que naufraga no infinito
O abismo que descortina a insanidade do que é
Ao longe um rosto que se dissipa na imensidão do tempo
Para fora do que vejo como um ninguém.
Vamos dizer que estou vivo
Com cara de quem morre vez por outra
Com cheiro de estrume
Ou com jeito de fezes atiradas contra o muro.
Já comprei os legumes e as verduras
Para fazer a tal salada
Que será ingerida
Pelo desejo em qualquer de devorar um ao outro.
Já decidi ser humano
Não remarei contra a maré
Todas as ondas do mundo
Vão se espatifar como um copo vazio
Que deixarei cair no chão
No momento de uma palavra inusitada.
Vamos mastigar o que resta
De nós mesmos neste pântano modorrento
Separando vez por outra as sílabas
Desta angústia infinita no além
Que ronda o mais distante dos homens
Que tem o hábito de caminhar pelas manhãs
Para denegrir o céu
Com seu cuspe vital."

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